Estamos todos* a comemorar o Orgulho (Pride em estrangeiro) LGBTI+, e é ver as empresas todas com a "bandeirinha", cheias de cor nos seus logótipos e com uma comunicação diferenciada durante este período - mesmo que nos restantes não se ligue muito à causa em concreto. Também muitos gays aproveitam a oportunidade para participar em alguns eventos do "Pride", em diversos locais do globo, todos despidos e a pinar como se não houvesse amanhã - sim, estou a ser um pouquinho moralista, mas a verdade é que não tenho nada a ver com isso.
Também nos últimos dias, tenho lido inúmeros textos a respeito deste assunto, tais como; testemunhos, relatos na primeira e noutra pessoa, e alguns documentos históricos, que nos alertam para que nada está garantido, ou que tudo aquilo conquistado, não possa ser perdido de um momento para o outro. Efetivamente, há que andar atento, porque os tempos não estão fáceis. E nesta mistura de leituras, bati de frente com um texto, que sublinhava que uma das coisas mais complicadas para qualquer LGBTI+ (e que fazia/faz tremer qualquer um), era quando se atirava: "olha, posso perguntar-te uma coisa"?
Sobre mim, posso dizer que sim. Era algo que me aterrorizava. Que me deixava com suores frios. Porque se é verdade, que qualquer pessoa podia querer saber onde seria o posto dos correios mais próximo, ou se naquela zona se pagava estacionamento, a minha mente focava logo no: "és gay, não és"? E a verdade, é que sempre que alguém me fazia essa pergunta de introdução, eu tremia. Pensava logo: "Fodasse. E agora, o que respondo"?
De todas a vezes que me perguntaram isso, ficaram-me gravadas na memória, duas situações. A primeira, que foi assim de chofre, partiu de uma colega minha de trabalho - e com quem não tinha muita confiança (a roçar o zero). À porta da empresa, numa tarde solarenga de julho, vira-se para mim e diz-me: "olha, posso perguntar-te uma coisa"? E eu, pensei: "deve ser qualquer coisa sobre o trabalho que estou a terminar". Mas não foi. Com a maior cara de pau do mundo, questiona-me sem dó (nem piedade), e com um ar de quem iria fazer uma descoberta fenomenal, que iria mudar o destino da humanidade: "és gay"? Fiquei tão atrapalhado, que não reagi no imediato. Passaram-me várias situações pela cabeça, que só apontavam para uma solução: fugir dali. "Ai que ela vai contar a toda a gente", "ai que toda a gente vai saber", "ai que vão-me mudar de serviço" (na altura trabalha numa área muito "heterossexual"), e "mas que merda de pergunta de uma tipa que não é minha amiga sequer", eram as minhas únicas preocupações naquele momento - e que pareceu durar horas. A medo, abri a boca e respondi "não". "Não o quê, caralho!" - recriminei-me de seguida, ainda assustado. E ela, não contente, remata: "de certeza? É que pareces mesmo". E eu, sem desligar a voz interior que só me inquiria "pareço como?", "sou demasiado feminino?", "tenho tiques?" e "mas o que faz um tipo parecer gay?", procurava perceber o motivo daquela abordagem.
Já em 2010, fui ter com um amigo meu ao Bairro. Levei o meu namorado na altura (desculpa rapaz, o problema não eras tu, era eu) e tentámos interagir com o grupo que lá estava. Assim, no meio do nada, veio uma rapariga ter comigo e diz-me: "olha, posso perguntar-te uma coisa"? E eu para dentro: "fodasse, outra vez esta merda"? Mas para fora, enchi o peito de ar e respondi: "sim, claro". E ela, com aquele ar de que iria fazer uma descoberta fenomenal, que iria mudar o destino da humanidade, pergunta: "vocês são gays"? E eu, a achar que já chegava, afirmei sim, "sou". "Ah, eu estava na dúvida, mas acertei" - remata ela com uma grande lata. E não contente com a sua "descoberta", resolve continuar: "Ah como és gay, deves conhecer o não-sei-quantos". Confesso que o meu cérebro no momento fez tilt. WTF? Mas quem é o não-sei-quantos? "Faz as coreografias no Trumps" - fez o favor de me explicar. Exato. Por ser gay, tenho de conhecer todos os gays que existem em Lisboa e arredores. Esta gente acha que o mundo é mais pequeno do que realmente é. Aliás, minha mãe é que é assim. Vê alguém na televisão com o sobrenome igual a algum/a amigo/a e conclui logo: "é primo de certeza"!
Bem sei, que as pessoas por natureza são curiosas, mas caraças, há certas perguntas que só se fazem a quem se tem confiança ou com quem tenhamos algum tipo de relacionamento mais aprofundado. Tudo bem, que fui perguntar ao porteiro do Purex ser era gay, mas atenção, eu estava bêbado (e achei o tipo muito giro, assim com o cabelo grisalho e tal), e não sou exemplo para ninguém. E quando quero saber se alguém é do "sindicato" vou ao Instagram e vejo os amigos em comum - e não chateio ninguém. #aprendam
*nos locais onde isso é possível, porque ainda existem muitos países que ser LGBTI+ é crime.
Sem comentários:
Enviar um comentário