domingo, fevereiro 06, 2022

Amizades

Não sou uma pessoa fácil. Tenho noção disso. Por isso não será de estranhar que tenha poucos amigos. Sejam amigos gays e/ou héteros. Na parte da heterossexualidade, tenho mais amigas que amigos, até porque desde cedo, não quis que se gerassem confusões desnecessárias. Também não me sentia muito confortável em desabafar com homens héteros, certos assuntos, e porque nunca me senti muito feliz em grupos de amigos. Até porque a conversa iria sempre parar "àquela gaja boa" ou "fazia isto e aquilo com não sei quem", quando não se falava de futebol (que odeio) ou transferências de mercado - e eu de transferências só percebo das bancárias. 

Também as minhas amizades LGBTI+ são reduzidas. Não sou aquele tipo de gajo que faz stories no Instagram com os 30 amigos gays. Não só porque não os tenho, mas também porque acho que é difícil trazer pessoas para a família que escolhemos, que valham a pena. A verdade, é que gosto de ter um núcleo de amigos pequeno, que seja fácil de gerir e que se complemente. Já fui demasiado traído por amizades no passado, a quem confiei a vida, para ser tudo assim tão simples. Com o tempo, tornei-me ainda mais desconfiado. Perdi e ganhei amigos, como é normal no percurso natural da vida. Uns foram porque se chatearam, outros porque não tiveram o que quiseram/precisavam, outros porque não souberam perdoar, e outros, simplesmente, porque que sim, porque o seu tempo tinha chegado ao fim. Tenho saudades de uns, de outros nem por isso. Dos meus amigos gays que ficaram, e que posso considerar grandes amigos, tenho dois que emigraram e um que só vejo uma vez por ano e mora quase ao meu lado (e que está sempre a arranjar desculpas para não nos encontrarmos).   

Mas o meu melhor amigo, aquele que sabia quase tudo de mim, morreu faz dois anos. Isso tornou-me uma pessoa triste por dentro. Uma pessoa diferente. Uma pessoa que pensa muitas vezes, se alguma vez nos iremos encontrar de novo, noutra dimensão. É impossível esquecer uma perda desta magnitude, até porque estava colada à minha pele. Ao meu caminho de descoberta de quem eu era, e de quem eu sou, desde o tempo do mIRC. Desde o tempo que falávamos em salas de chat como a #gay, a #gaybetos ou a #bibetos. Desde o tempo, que os nossos nomes eram os nossos nicknames e não nos preocupávamos com aqueles que estavam registados oficialmente. Nunca tinha tido amigos gays até então, e ele foi o primeiro. O que teve paciência. A quem contei os meus segredos mais profundos. Aquele que não me julgou. Aquele que me estendeu a mão quando estava no fundo do poço e aquele que me motivava quando eu estava na merda. Podiam passar meses sem que nos falássemos, mas bastava uma troca de mensagens e parecia que tínhamos acabado de estar na parvoíce há 5 minutos atrás. Tenho saudades dos nossos jantares a dois no Bairro Alto, dos copos no Purex (onde eu já bêbedo fui ter com o segurança, e além de lhe ter dito que ele era giro, perguntei se era gay - e que não era), dos nossos dramas sentimentais, que compartilhávamos de forma a gerar empatia, e de tanta coisa que me preenchia, mas que de um momento para o outro... desapareceu. Apenas ficou um grande vazio. Fazer amigos nunca foi fácil para mim. Amigos gays muito menos. E tenho a noção, que este lugar que ele deixou, será insubstituível. Mas atenção: não sou uma pessoa amarga. Sou uma pessoa cada vez mais realista face aos sentimentos. 


E posto isto, vou ali até um centro comercial da periferia de Lisboa, ajudar um outro amigo a comprar uma fatiota para o seu aniversário. Bom domingo! 

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