domingo, maio 17, 2020

Passados



Estava a falar com uma amiga minha, e estava-lhe a contar o meu procedimento para conhecer pessoas há 15 anos atrás. Sim, porque nessa altura, ainda andava tudo muito escondido, não tanto como em 1980, é certo, mas ainda assim, escondido. E como fazia?


Bom, atentem nos passos:

1. Entrava no mIRC e na sala #gay, ou #gaybetos, ou o que houvesse. “Via” algum "nick" que me interessasse, e metia conversa.

2. Se a conversa continuasse simpática, ou sentisse empatia pela pessoa, passava para o MSN. Aí, as conversas eram mais ou menos profundas, trocavam-se fotografias ou ligava-se a webcam. Se o interesse permanecesse em ambas as partes, tentava-se aprofundar o “conhecimento” e trocavam-se números de telemóvel.

3. Com a troca de números de telemóvel, a “coisa” sempre era mais séria. O contacto era mais frequente, mais expedito e mais eficaz. Já havia alguma cobrança do “não me respondeste”.

4. Se o passo anterior corresse bem, e a vontade ainda subsistisse (muitas vezes já tinha esmorecido, de um lado, ou de outro), combinava-se um encontro ao vivo. Era aí que nós avaliávamos o “conjunto”. Normalmente, marcava os meus encontros em sítios com algumas pessoas. Optava sempre (porque sou de Lisboa) pelos jardins da Gulbenkian, pelo Picoas Plaza, pelo Monumental, pelo Atrium Saldanha (ou Residence) ou ainda, algures no Chiado.  


Com o surgimento de sites como o Gaydar ou o Manhunt, o procedimento era, mais ou menos o mesmo, sendo que a parte visual era logo ali desmontada. A diferença, era mesmo a questão da conversa…  da picardia… da interação. Embora o mIRC tivesse o grande problema de imaginarmos uma pessoa que não existia (e a desilusão ser certa), tinha a vantagem de conseguirmos falar (ou teclar) com alguém, sem a necessidade de correspondermos aos seus padrões físicos. Podíamos só “jogar conversa fora”, passar um bocado de tempo, ou sentir alguma normalidade em estar num local a falar, sem outra intenção… que não fosse falar (uma vez que não haviam bares/cafés de jeito, onde pudéssemos fazer isso de uma forma mais natural). Ahhhhh! E o mIRC tinha ainda outra mais valia: a questão do anonimato, garantida pelos "nicknames". E qual era o meu? A verdade, é que nesta fase tive alguns, mas isso ficará para outra partilha. 

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